sexta-feira, 22 de maio de 2009

A Quinta Feira da Espiga


O fenómeno de revitalização vegetativa, em que a natureza após a longa letargia invernal acorda, desabrochando numa sinfonia de vida, constituiu sempre para as populações arcaicas, um momento mágico e determinante da visão cósmica da existência. Momento aguardado com a ansiedade das perspectivas de novas colheitas mas, igualmente despoletador de dúvidas acerca da sua efectiva realização, este é o tempo em que chega a Primavera. Tempo sagrado, como todos os tempos de transição, nele se efectuavam, em épocas passadas, diversos cerimoniais cujas funções exprimiam a comemoração festiva do eclodir primaveril e, algumas vezes até, rituais de expulsão simbólica do Inverno que terminava. Neste sentido, realizaram-se durante séculos, por todo o mundo mediterrâneo, grandiosos festivais florais em que jovens nubentes se espalhavam pelos campos e, em alegre convívio cantavam e dançavam, e se enfeitavam com verduras e flores, num ritual ancestral de que o nosso “dia da espiga” constitui herdeiro directo, embora minorado. Poder-se-á dizer, então, que fazendo parte deste ciclo festivo da Primavera, a Quinta Feira da Ascensão, ou “da espiga”, corresponde à cristianização de um complexo de festividades pagãs ligadas à celebração e consagração da natureza. De facto para as sociedades primitivas, a regeneração vegetal, de que a agricultura é função, está dependente, em grande parte, das boas ou más vontades divinas e, em última instância, da maior ou menor fertilidade da terra-mãe. Não é portanto de admirar que este tempo vital, expresso no renascer das plantas, no desabrochar das árvores e na proliferação das flores e frutos, desencadeasse grandes manifestações de alegria, em que jovens se dirigiam para os campos, para aí, em comunhão com a natureza, festejarem e, naturalmente, adquirirem também eles as energias fecundantes que nesta altura fluíam em profusão.Mas o “dia da espiga” era também o “dia da hora”. Herdeiro de simbolismos primevos, este era um tempo particularmente sagrado. Um tempo por muitos considerado “o dia mais santo do ano”, em que se não devia trabalhar e em que “nada bulia”, em que as transgressões referentes ao trabalho se revelam estranhamente ineficazes, quando não se manifesta até outro tipo de sanção mais radical. Avultava, aí, uma hora em que as coisas possuíam especiais valências e singulares transcendências... o meio-dia! Essa é a hora em que os “as águas dos ribeiros não correm, o leite não coalha, o pão não leveda e até as folhas se cruzam” configurando assim, devotadamente, o sinal da cruz”! De sacralismo tão intenso que, como se crê, na zona do Vale do Tejo, nem os “passarinhos vão ao ninho”! Ao meio-dia se deviam, então, colher as ervas que iam ser utilizadas na farmacopeia popular durante todo o ano. Ao meio-dia se deviam preferencialmente colher os diversos raminhos que no seu conjunto constituíam a “espiga”, temporalidade que por razões funcionais foi, em muitas zonas, caindo em desuso.É um tempo prodigioso, eivado de proibições e obrigações. Nalgumas aldeias acreditava-se que o pão cozido era sagrado, mantendo-se incorrupto até ao ano seguinte. Em casa “a espiga” era, e é, guardada atrás da porta ou junto da imagem de particular devoção. A mera existência numa habitação desse simples raminho, constitui poderoso e multifacetado amuleto. Para dar saúde, alegria e abundância e, especialmente, para que nessa casa nunca faltem os indispensáveis azeite e pão! Aliás, o seu sentido propiciatório era, em tempos idos, evidente e diversificado. Quando das trovoadas, um bocado posto a arder à lareira afastava os raios e oferecia protecção eficaz contra a tormenta. A este tempo estavam ainda ligadas as oferendas das “primícias” e as “benções dos campos”, nos nossos dias, por razões funcionais, de contornos institucionais mais ou menos litúrgicos e de temporalidade mais variada. Em muitas zonas do país, costumavam-se soltar, durante a missa, grupos de andorinhas que, paciente e delicadamente, se tinham apanhado nos dias anteriores, adornadas as mesmas com coloridas fitinhas e lacinhos vermelhos.Enfim, sejam ou não vistos, hoje, numa perspectiva canónica, fazendo ou não parte do imaginário popular, estas tradições que comemoram o desabrochar da Primavera são sempre tempos especiais na temporalidade mística das populações rurais mediterrâneas e, na sua coexistência com o sacralismo da terra-mãe, hierofania exemplar da sua relação com a esfera do sagrado.É o milagre da vida, que se renova periódica e inexoravelmente todos os anos. Da terra prenhe eclodem os frutos naturais. Semente divina, condição de sobrevivência, dádiva da fertilidade que as massas urbanas apenas, hoje, apreciam à distância!

terça-feira, 10 de março de 2009

A Quaresma: Voltarmo-nos para Deus

A Quaresma orienta o nosso pensamento, em primeiro lugar, para a imagem do deserto, aquele onde Jesus viveu quarenta dias de solidão ou aquele que o povo de Deus atravessou, caminhando durante quarenta anos. E, no entanto, quando chegavam estas semanas que precedem a Páscoa, o irmão Roger gostava de lembrar que esse não era um tempo de austeridade ou de tristeza, nem um período para alimentar a culpabilidade, mas sim um momento para cantar a alegria do perdão. Ele via a Quaresma como quarenta dias para nos prepararmos para redescobrir pequenas primaveras nas nossas vidas.
No início do Evangelho de São Mateus, quando João Baptista proclama «arrependei-vos!», ele quer dizer «voltai-vos para Deus!» Sim, durante a Quaresma, gostaríamos de voltar-nos para Deus para acolher o seu perdão. Cristo venceu o mal, e o seu perdão constante permite-nos renovar uma vida interior. É a uma conversão que somos chamados: não a voltarmo-nos para nós próprios numa introspecção ou num perfeccionismo individual, mas a procurar uma comunhão com Deus e também uma comunhão com os outros.
Voltarmo-nos para Deus! É verdade que, no mundo ocidental, tornou-se difícil, para algumas pessoas, acreditar em Deus. Elas vêem a existência de Deus como um limite à sua liberdade. Pensam que devem lutar sozinhas para construir a sua vida. Parece-lhes inconcebível que Deus os acompanhe.
No ano passado, fui visitar os nossos irmãos que vivem na Coreia há trinta anos. Durante o caminho, acompanhado por outro irmão, estive em encontros de jovens em vários países asiáticos. O que me marcou na Ásia foi o facto de a oração parecer natural. Nas diferentes religiões, as pessoas têm espontaneamente na oração uma atitude de respeito, ou mesmo de adoração.
Certamente, nestas sociedades não há menos tensões ou violências do que no Ocidente. Mas um sentido de interioridade é talvez mais acessível, um respeito perante o milagre da vida, pela criação, uma atenção ao mistério, a algo que vai para além do que podemos ver.
Como renovar uma vida interior descobrindo e voltando sempre de novo a descobrir uma relação pessoal com Deus? Há em todos nós uma sede de infinito. Deus criou-nos com este desejo de um absoluto. Deixemos viver em nós esta aspiração!
Entre os cânticos de Taizé, um deles expressa esta espera. A letra é de um poeta espanhol, Luis Rosales, inspirado por São João da Cruz: «De noite iremos e, para encontrar a fonte, só a sede nos ilumina.» Para algumas pessoas, o tempo da Quaresma é tempo de jejum. Não que a ascese tenha um valor por si própria, mas há em cada pessoa uma espera mais profunda do que as esperas superficiais, uma sede mais essencial. E essa sede pode iluminar o nosso caminho.
Se, por vezes, caminhamos de noite ou se atravessamos como que um deserto, não é para seguirmos um ideal. Seguimos uma pessoa: Cristo. Não estamos sozinhos, ele vai à nossa frente. Segui-lo implica um combate interior, com decisões a tomar, com fidelidades de toda uma vida. Neste combate, não nos apoiamos sobre as nossas próprias forças, mas abandonamo-nos à sua presença. O caminho não está traçado de antemão, implica também acolher surpresas, criar com o inesperado.
Deus não se cansa de retomar o caminho connosco. Podemos acreditar que uma comunhão com ele é possível e assim nunca nos cansamos de, também nós, retomar sempre de novo o combate. Não perseveramos para nos apresentarmos diante de Deus com o nosso melhor aspecto. Não, aceitamos avançar como pobres do Evangelho, que se confiam à misericórdia de Deus.
A Quaresma é um tempo que nos convida à partilha. Leva-nos a pressentir que não nos sentiremos realizados se não consentirmos a renúncias. Renúncias feitas por amor. Quando, noutra ocasião, Jesus se encontrava no deserto, cheio de compaixão por aqueles que o tinham seguido, multiplica cinco pães e dois peixes para alimentar cada pessoa. Que sinais de partilha podemos nós realizar?
O Evangelho valoriza a simplicidade de vida. Chama-nos a dominar os nossos próprios desejos para nos conseguirmos limitar, não por constrangimento mas por escolha. Este apelo é hoje muito actual, não somente em termos pessoais, mas na vida das nossas sociedades. A simplicidade escolhida livremente permite que os mais favorecidos resistam à corrida ao supérfluo e contribui à luta contra a pobreza imposta aos mais deserdados.
Durante este tempo da Quaresma, ousemos rever o nosso estilo de vida. Não para dar má consciência àqueles que não o fazem, mas com o propósito de sermos solidários com os mais desamparados. O Evangelho incentiva-nos a partilhar livremente, dispondo das coisas com beleza simples da criação.
Meditação do irmão Alois (taizé)

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Uma vida Nova

Caros amigos seareiros

No passado fim de semana iniciei uma nova etapa na minha vida, à qual agora não posso mais chamar apenas minha...
Quero antes de mais agradecer a quantos partilharam comigo esse momento.
Quero acima de tudo estar disponivel para o que a Seara necessitar e estejam à vontade para o pedir, pois eu sou um pouco despassarado.

"Constroi a tua casa sobre a Rocha"

Um grande abraço em Cristo

David S.